domingo, 16 de fevereiro de 2014

Sobre o Desafio de Ser Diferente

Quando preparo uma aula há inúmeros aspetos em que penso: o que é primordial que aprendam (comunicativa, lexical e lingusticamente); que competências vou desenvolver; como vou desenvolver as aulas para lecionar determinados conteúdos; como é que os meus alunos vão reagir (se vão gostar ou não); como vou promover a expressão oral em língua estrangeira (uma preocupação essencialmente para os alunos do primeiro ano de língua) e também equaciono as minhas (re)ações.
Numa das minhas aulas de 7º ano o tema a desenvolver era a "Descrição Física", como sempre faço quando começo algum conteúdo lexical que é propício ao debate/expressão oral, coloquei algumas frases sobre "Beleza" e outras frases (dar a opinião/mostrar acordo e desacordo) que ajudariam os meus alunos a expressarem-se oralmente em língua estrangeira. 
Questionei-os sobre a real importância da beleza; dos critérios para se ser belo ou não o ser; sobre os parâmetros de beleza atuais e a questão da beleza-os-outros-e-as-suas-opiniões. Foi um início de aula bastante tranquilo com expressão oral q.b e com a participação de todos. 
A propósito da diferença (em contexto de beleza!) falei-lhes naturalmente e de uma forma totalmente espontânea de uma situação que a turma vive. Fi-lo através de analogias e comparações mais ou menos diretas. Eu penso que a mensagem chegou e anseio que a "semente" tenha sido plantada em alguns deles. Quase todos ficaram a pensar nisso e pelo menos 3 ignoraram-na completamente. O desafio agora é regar a semente com paciência, entusiasmo e dedicação. Talvez possa tornar-se numa árvore frondosa e vigorosa. Não é fácil ser diferente numa sociedade que formata adolescentes (e adultos!) de acordo com determinadas (e muitas vezes erradas) regras e preceitos sociais. Não é fácil ser diferente e mesmo assim ser "fixe". Não é fácil ser diferente quando é suposto ser igual aos outros, fazer o que os outros fazem, pensar como os outros pensam. Não é fácil ser diferente mas talvez se possa entusiasmar e motivar os adolescentes a, pelo menos, fazerem a diferença em situações diária de convivência.
A mensagem transmitida nesse dia foi muito próxima da de Agostinho Silva que agora partilho. Encontrei-a a semana passada quando procurava poemas para comemorar o dia de São Valentim lá na escola.

Ser Diferente

A única salvação do que é diferente é ser diferente até o fim, com todo o valor, todo o vigor e toda a rija impassibilidade; tomar as atitudes que ninguém toma e usar os meios de que ninguém usa; não ceder a pressões, nem aos afagos, nem às ternuras, nem aos rancores; ser ele; não quebrar as leis eternas, as não-escritas, ante a lei passageira ou os caprichos do momento; no fim de todas as batalhas — batalhas para os outros, não para ele, que as percebe — há de provocar o respeito e dominar as lembranças; teve a coragem de ser cão entre as ovelhas; nunca baliu; e elas um dia hão de reconhecer que foi ele o mais forte e as soube em qualquer tempo defender dos ataques dos lobos. 


Agostinho da Silva, in 'Diário de Alcestes'

Na quarta-feira passada dinamizei mais uma atividade a pares e no final da aula uma aluna aproximou-se de mim e disse-me em sussurro: "A professora fez esta atividade hoje para realçar a mensagem da última aula não foi?" Eu não disse nada, ela sorria e senti que esperava uma resposta. Pisquei-lhe o olho e disse-lhe "Tu és perspicaz M.!" Ela não sabe mas fez a diferença no meu dia! 
Obrigada M. é também por ti que vale a pena!

sábado, 15 de fevereiro de 2014

Sobre o super-competente-professor-de-recreio

Não sei se já tive oportunidade de dizer isto aqui desta forma tão clara e transparente: sou profissionalmente extremamente realizada. Não obstante todas as maleitas características da profissão, dos momentos mais inglórios e desprovido de reconhecimento (mas há ainda alguma esperança de que isso aconteça?) eu tenho muito orgulho no que faço. Entendo que o leitor mais sensível censurar-me-á por não ter colocado uma mensagem inicial alertando para o carácter violento e desapropriado deste tipo de linguagem. 
Na verdade por vezes é assim que me sinto: desadequada ao pensamento característico da atualidade. Talvez nesta minha atitude pese o facto de "o meu tempo" não ser muito diferente deste tempo. As dificuldades que há 8 anos existiam  para quem entrava na profissão são praticamente iguais às dos nossos tempos. A diferença é que atualmente há mais gente, profissionais que já estão na carreira, a sofrer com essas condições e portanto o número de insatisfeitos cresce consideravelmente. 
No meu caso o que me deixa extremamente chateada,  mas não desmotivada, são aqueles que chamo de "professores de recreio" que, como todo o bom "treinador de bancada", tem uma opinião sobre o tema. No caso dos "treinadores de bancada" penso que é mais justo uma vez que todos temos acesso ao jogo através de visualização direta ou indireta e podemos concordar ou não com as opções/opiniões. Já menos justos são os comentários dos "professores de recreio" que não sabendo o que acontece na seio da Escola e menos na sala de aula opinam sobre tudo e todos. É isso sinceramente que me irrita nestes supostos "professores de recreio". Eles têm tantas caras como as opiniões que ajudam a comunidade a formar sobre a Escola e os Professores. O mais curioso é que eles são a própria Escola mas como estão demasiado ocupados a tecer considerações sobre o que sabem e não sabem sobre ela ainda não se deram conta isso.  Esses tais ainda não se deram conta de que  falar mal não substitui a ausência destes na vida da Escola; não substitui a sua ausência em reuniões em que é solicitado; não substitui o acompanhar do seu educando ou não substitui o desinteresse pelo percurso escolar deste. Como qualquer um, o professor de recreio precisa entender uma vez por todas que para ganhar o Euromilhões é necessário disponibilizar tempo para escolher as apostas e, como em todos os jogos, não desanimar a uma primeira derrota e voltar a tentar. A diferença entre apostar no Euromilhões e apostar na Escola é que na segunda aposta não podemos solicitar à máquina que escolha por nós, somos nós que temos de agir. 
Se apostei 5 vezes no Euromilhões foi muito. Já no que diz respeito à Escola faço-o todos os dias. Vale a pena... eu pelo menos faço com que valha. 
A próxima vez que ouvir falar da Escola, verifique as referências, veja se a informação é fidedigna.

sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

Sobre a Amizade (outra vez)


Aos amigos verdadeiros,
Aos que estão sempre mesmo quando os outros se afastam.

Feliz Dia de São Valentim!! 


O que Distingue um Amigo Verdadeiro

Não se pode ter muitos amigos. Mesmo que se queira, mesmo que se conheçam pessoas de quem apetece ser amiga, não se pode ter muitos amigos. Ou melhor: nunca se pode ser bom amigo de muitas pessoas. Ou melhor: amigo. A preocupação da alma e a ocupação do espaço, o tempo que se pode passar e a atenção que se pode dar — todas estas coisas são finitas e têm de ser partilhadas. Não chegam para mais de um, dois, três, quatro, cinco amigos. É preciso saber partilhar o que temos com eles e não se pode dividir uma coisa já de si pequena (nós) por muitas pessoas. 

Os amigos, como acontece com os amantes, também têm de ser escolhidos. Pode custar-nos não ter tempo nem vida para se ser amigo de alguém de quem se gosta, mas esse é um dos custos da amizade. O que é bom sai caro. A tendência automática é para ter um máximo de amigos ou mesmo ser amigo de toda a gente. Trata-se de uma espécie de promiscuidade, para não dizer a pior. Não se pode ser amigo de todas as pessoas de que se gosta. Às vezes, para se ser amigo de alguém, chega a ser preciso ser-se inimigo de quem se gosta.

Em Portugal, a amizade leva-se a sério e pratica-se bem. É uma coisa à qual se dedica tempo, nervosismo, exaltação. A amizade é vista, e é verdade, como o único sentimento indispensável. No entanto, existe uma mentalidade Speedy González, toda «Hey gringo, my friend», que vê em cada ser humano um «amigo». Todos conhecemos o género — é o «gajo porreiro», que se «dá bem com toda a gente». E o «amigalhaço». E tem, naturalmente, dezenas de amigos e de amigas, centenas de amiguinhos, camaradas, compinchas, cúmplices, correligionários, colegas e outras coisas começadas por c.
Os amigalhaços são mais detestáveis que os piores inimigos. Os nossos inimigos, ao menos, não nos traem. Odeiam-nos lealmente. Mas um amigalhaço, que é amigo de muitos pares de inimigos e passa o tempo a tentar conciliar posições e personalidades irreconciliáveis, é sempre um traidor. Para mais, pífio e arrependido. Para se ser um bom amigo, têm de herdar-se, de coração inteiro, os amigos e os inimigos da outra pessoa. E fácil estar sempre do lado de quem se julga ter razão. O que distingue um amigo verdadeiro é ser capaz de estar ao nosso lado quando nós não temos razão. O amigalhaço, em contrapartida, é o modelo mais mole e vira-casacas da moderação. Diz: «Eu sou muito amigo dele, mas tenho de reconhecer que ele é um sacana.» Como se pode ser amigo de um sacana? Os amigos são, por definição, as melhores pessoas do mundo, as mais interessantes e as mais geniais. Os amigos não podem ser maus. A lealdade é a qualidade mais importante de uma amizade. E claro que é difícil ser inteiramente leal, mas tem de se ser. 

Miguel Esteves Cardoso in Os meus problemas

quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

Sobre os Amigos de Circunstância

Há uns anos escrevi sobre os "amigos de circunstância" que encontrei num determinado contexto de trabalho. Este termo suscitou alguma curiosidade em relação ao motivo que me leva a utilizá-lo de uma forma tão convicta. 
Os meus "amigos de circunstância" são aquelas pessoas que conheci num determinado contexto (portanto numa circunstância) e que pelas experiências conjuntas que tivemos; pelos objetivos que alcançámos juntos; pelo caminho que percorremos juntos ou pela forma como nos respeitámos e respeitámos as nossas diferenças ganharam esse estatuto: o de Amigos. E se são Amigos é exatamente por estes motivos. Neste caso a "circunstância" é apenas o eixo promotor de desenvolvimento de competências sociais e pessoais que de uma forma natural nos aproximam uns dos outros.
Estes Amigos de Circunstância a quem hoje dedico este post são cada um deles [ines]quecíveis à sua maneira e é por isso que penso que merecem lugar neste meu espaço virtual.
Foi em novembro que os conheci, 45 minutos depois da hora marcada para a primeira de noventa horas destinadas à Formação Pedagógica Inicial de Formadores em Portimão. Cheguei atrasada e o meu local estava vazio. "Raios...fiquei mesmo no meio da sala em forma de U!!" pensei maldizendo a imagem de GPS que tinha retirado no dia antes de começar a formação para não me perder nesse dia. Depois de incomodar metade dos formandos para finalmente ocupar o meu lugar, sentei-me. Deram-me uma folha em branco para escrever: dados pessoais relevantes; expetativas em relação ao curso; uma qualidade e aspetos que considerava que devia melhorar. Eu nesse dia não podia imaginar, por muito altas que estivessem as minhas expetativas (e não estão sempre?), o que as horas de trabalho com aquele grupo me proporcionariam. E ainda bem que assim foi, caso contrário não estaria aqui a escrever sobre eles. 
São um grupo de trabalho entusiasta, trabalhador, esforçado, dedicado, criativo e crítico. Na sua companhia não há motivação que fique abalada nem rostos que não transpareçam um sorriso. 
Aqueles sábados com 8 horas de trabalho passavam sem que nos déssemos conta. Não me recordo de um único dia em que me apetecesse ir embora antes de chegar às 18:00 ou que acordasse sem vontade de ir. Penso que só por si este sentimento caracteriza o enorme gosto que era estar com o grupo.
As horas passaram e o grupo transformou-se. As mudanças que advêm das aprendizagens realizadas refletem-se em cada opinião dada; em cada opção tomada; em cada reflexão feita; em cada crítica construtiva  ouvida. 
Eu tenho muito orgulho nestes Amigos e agradeço a oportunidade de poder tê-los conhecido nesta circunstância. Agradeço a oportunidade de me terem feito crescer, de me terem dado a oportunidade de dizer o que penso; de ser ouvida; de me terem ensinado tantas coisas e de me terem dado o privilégio de poder estar outros momentos com eles depois destas 90 horas. 

O futuro só nos poderá reservar projetos auspiciosos e momentos de animado e bem-disposto convívio!

Obrigada Carla, Ana, Susana, Manuel; Cláudia, Sandra, Neusa e Marco. São pessoas como vocês...