quarta-feira, 7 de maio de 2014

Sobre a Amizade

Todos os momentos são bons para homenagear os amigos. É realmente difícil estabelecer uma rede de amigos estável e que estejam ao nosso lado "independentemente de". Não tenho muitos amigos mas creio que os tenho em número suficiente para saber reconhecê-los.
O texto que aparece a seguir é da autoria de Miguel Esteves Cardoso e tem o título de "Os Amigos Nunca são para as ocasiões."

 Obrigada aos meus amigos, mesmo para aqueles com quem não estou frequentemente ou aos que magoo.

Os amigos nunca são para as ocasiões. São para sempre. A ideia utilitária da amizade, como entreajuda, pronto-socorro mútuo, troca de favores, depósito de confiança, sociedade de desabafos, mete nojo. A amizade é puro prazer. Não se pode contaminar com favores e ajudas, leia-se dívidas. Pede-se, dá-se, recebe-se, esquece-se e não se fala mais nisso.

A decadência da amizade entre nós deve-se à instrumentalização que tem vindo a sofrer. Transformou-se numa espécie de maçonaria, uma central de cunhas, palavrinhas, cumplicidades e compadrios. É por isso que as amizades se fazem e desfazem como se fossem laços políticos ou comerciais. Se alguém «falta» ou «não corresponde», se não cumpre as obrigações contratuais, é logo condenado como «mau» amigo e sumariamente proscrito. Está tudo doido. Só uma miséria destas obriga a dizer o óbvio: os amigos são as pessoas de que nós gostamos e com quem estamos de vez em quando. Podemos nem sequer darmo-nos muito, ou bem, com elas. Ou gostar mais delas do que elas de nós. Não interessa. A amizade é um gosto egoísta, ou inevitabilidade, o caminho de um coração em roda-livre.

Os amigos têm de ser inúteis. Isto é, bastarem só por existir e, maravilhosamente, sobrarem-nos na alma só por quem e como são. O porquê, o onde e o quando não interessam. A amizade não tem ponto de partida, nem percurso, nem objectivo. É impossível lembrarmo-nos de como é que nos tornámos amigos de alguém ou pensarmos no futuro que vamos ter.
A glória da amizade é ser apenas presente. É por isso que dura para sempre; porque não contém expectativas nem planos nem ansiedade.


Miguel Esteves Cardoso, in 'Explicações de Português'

domingo, 4 de maio de 2014

Carta de [des]amor

Breve carta a um futuro ex.

                Amor,
                Se algum dia o meu olhar e a forma como te cativo e envolvo te fizerem sentir como se não houvesse outra além de mim, esse sentimento não passará uma doce ilusão. .
                A vontade de te fazer sentir especial, de te surpreender, de me entregar a ti incondicionalmente dará lugar, mais tarde ou mais cedo, a um comodismo e inércia, a uma insatisfação premente, a uma alienação do que te diz respeito.
                Com mais ou menos evidência não tardarás a considerar-me uma fraude: porque perdi a energia que te transmitia e em tempos te fascinou; porque já não te faço rir e já não rio; porque deixei de ter respostas para as tuas perguntas; porque já não faço perguntas.
                Um dia, mais tarde ou mais cedo, perceberás que não estou à altura, que mereces melhor, que precisas de mais.
                E eu vou dizer-te que te avisei.


                E avisei.