Há já algum tempo que queria escrever sobre uma das experiências que fez com que eu hoje em dia seja da forma que sou. É daquelas experiências que transformou a forma de pensar a minha vida e os que me rodeiam. Não são muitas as pessoas que sabem da sua existência, pelo menos de uma forma detalhada: ela é extensa e acaba por ser inglório tentar contá-la porque penso sempre que ninguém a compreende realmente.
Neste espaço não tenho esse problema: sou eu a escrever e, quanto muito, um ou dois leitores disponíveis para a ler. Assim sendo, se estes optarem por ler o que aqui está escrito a responsabilidade é exclusivamente sua, assim como a liberdade de deixarem de o ler.
Devo alertar que, embora o que aqui possa ser descrito pareça pouco verosímil, acentuando o facto de já terem passado alguns anos e os detalhes estarem já esquecidos, nas linhas [e posts] que se seguem não haverá nada que não reflita a verdade.
Santiago de Compostela, fevereiro de 2005
Depois de um processo complexo (nada semelhante ao que acontece atualmente) fui selecionada para o Programa de mobilidade de Estudantes Erasmus na Universidade de Filologia da Universidade de Santiago de Compostela.
Em fevereiro de 2005 começava aquele que eu esperava (e tinha a plena convicção que assim teria que ser) que fosse o meu último semestre como estudante. Os receios eram muitos mas as expectativas também.
O meu percurso académico em Santiago foi excecionalmente trabalhoso: era de bom grado que frequentava a biblioteca da cidade aberta 24 horas por dia em época de exames. Achava fantástico estar cheia a altas horas da manhã e ter, ainda por cima, pessoas aparentemente empenhadas no estudo. Aconteceu mais do que uma vez, ir até lá só para ver o "ambiente" depois de sair de um qualquer "mesón". Não faltava a nenhuma aula, tirava apontamentos até me doerem as mãos, fazia repetidamente exercícios de linguística espanhola, pesquisava insistentemente sobre bibliografia para o meu seminário de final de licenciatura.
Mas o meu percurso académico em Santiago não foi só estudar. As festas Erasmus eram uma constante por toda a cidade. Os finais de tarde num "mesón" acompanhados por um copo de vinho e uma tapa de presunto e queijo (não tínhamos dinheiro para grandes luxos!), jantares típicos de partilha do que de melhor tem Portugal, Polónia, República Checa e Suiça, passeios pela cidade ao amanhecer...
Foram sem qualquer tipo de dúvida momentos fantásticos os que passámos ao longo dos seis meses. Quando a nossa estadia estava a chegar ao fim um dos simpáticos polacos fez-nos (aos sete) uma proposta: fazer o único Caminho de Santiago que em vez de chegar à cidade de Santiago de Compostela (como acontece aliás com quase todos), sai dessa cidade e chega à aldeia de Muxia na Costa da Morte (deve o seu nome à quantidade de rochas que e que é/foi motivadora de vários naufrágios). Por uma questão de timming, o querido polaco cujo nome nem sequer tento escrever sugeriu que fizéssemos o caminho ao contrário uma vez que dizia-se que as paisagens mais bonitas eram as que iriamos encontrar em Muxia/Finisterra.
Neste momento, o motivo que nos levava a fazer o Caminho era pura e simplesmente turístico quando, na credencial que posteriormente arranjámos, vinha escrito que o único motivo pelo qual se deve fazer é o religioso.
Em três dias arranjámos o que era (ou o que pensávamos que era) necessário: a credencial que nos certificava como peregrinos, uma mochila com [pouca] roupa, alguma comida e um saco-cama.
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